Por Valéria Dias - valdias@usp.br
Algumas crenças ligadas a imigração libanesa no Brasil foram sendo construídas ao longo do tempo. Uma delas diz que os mascates libaneses sempre enriquecem e se transformam em “doutores”. Já outra crença aponta que Dom Pedro II teria sido um grande incentivador dessa imigração. Ao estudar o tema em seu mestrado, a pesquisadora Samira Adel Osman constatou que essas crenças não passam de mitos.
“Essa história de que todo libanês que trabalha no Brasil como mascate acaba enriquecendo não é verdadeira. Segundo o mito, a primeira geração de libaneses foi trabalhar como mascate. A segunda geração se tornou comerciante. E a terceira, doutor. Apesar de existirem alguns casos em que isso realmente aconteceu, muitos deles ainda ganham a vida exercendo a função de mascate”, aponta a pesquisadora, que atua como professora de História da Ásia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
A pesquisa foi realizada no Núcleo de Estudos em História Oral (NEHO) da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, sob a orientação do professor José Carlos Sebe Bom Meihy. O resultado do mestrado é o livro recentemente lançado “Imigração Árabe no Brasil: história de vida de libaneses muçulmanos e cristãos” (Editora Xamã) com apoio do NEHO/FFLCH. A obra traz o relato de vida de libaneses que saíram do Oriente Médio a partir de 1950 em busca de melhores condições de vida, e também de seus descendentes, nascidos aqui no Brasil.
No próximo dia 05 de junho, a partir das 17 horas, haverá um novo lançamento do livro, seguido de mesa-redonda, no Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos (Diversitas USP), localizado na Avenida Lineu Prestes, 159, Cidade Universitária, na Casa de Cultura Japonesa. Na ocasião também haverá o lançamento da obra “As mil e uma noites mal dormidas: a formação da Republica Islâmica do Irã”, de autoria do pesquisador Murilo Sebe Bom Meihy, historiador, doutorando em Estudios Árabes e Islámicos pela Universidade Autónoma de Madrid. O evento acontecerá no auditório e contará com a presença dos autores dos livros e também dos professores Zilda Márcia Grícoli Iokoi, coordenadora do Diversitas e do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades da USP, e de José Carlos Sebe Bom Meihy, coordenador do NEHO.
Samira conta que o Líbano é um país basicamente agrícola. As famílias árabes (tanto cristãs como muçulmanas) se organizam em verdadeiros “clãs”, onde além do pai, da mãe e dos filhos, há também os tios, os primos, os avós. A pesquisadora explica que, quando o jovem chega a vida adulta, ele percebe que não há terra para todo mundo. Além disso, a terra de lá é limitada e não é tão fértil. Então, ele sai em busca de melhores condições, pensando em retornar posteriormente para melhorar a vida da família, ou seja, pensando em uma imigração provisória. “O principal destino era a América, tanto os Estados Unidos como o Brasil. O pouco de dinheiro ganho era enviado para o Líbano e representava muito para os que recebiam”, diz.
Segundo a pesquisadora, essa questão de sair do Líbano em busca de melhores condições de vida já era visível no final do seculo 19. Com o final do Império Otomano, houve uma grande perseguição religiosa aos cristãos. No século 20, tivemos a 1ª e 2ª guerras mundiais, além da Guerra Civil de 1975”, conta Samira. “Esses aspectos econômicos foram importantes para que ocorressem as imigrações. Sempre que ocorre algum conflito lá, ou algum outro tipo de problema, muitos vem para o Brasil.”
Mascates
As imigrações libanesas do final do século 19 tiveram como destino o sudeste, especialmente São Paulo e Rio de Janeiro, para trabalhos nas lavouras de café, e na região norte, onde a borracha e a lavoura foram as atividades principais. “Outros chegaram ao Brasil e já começaram a trabalhar como mascates”, explica. A figura do mascate aliás, ainda não deixou de existir, segundo Samira: nas levas mais recentes, muitos vieram exercer o ofício.
As imigrações libanesas do final do século 19 tiveram como destino o sudeste, especialmente São Paulo e Rio de Janeiro, para trabalhos nas lavouras de café, e na região norte, onde a borracha e a lavoura foram as atividades principais. “Outros chegaram ao Brasil e já começaram a trabalhar como mascates”, explica. A figura do mascate aliás, ainda não deixou de existir, segundo Samira: nas levas mais recentes, muitos vieram exercer o ofício.
Numericamente, os libaneses que atualmente exercem tal função não é tão expressiva, mas Samira constatou outras áreas de atuação como pequeno comércio e indústria têxtil, sobretudo de jeans, e movelar. Segundo ela, quando os pioneiros chegaram ao Brasil, criaram uma propaganda positiva do país e divulgaram entre os familiares, se tornando referência para os outros. “De uma certa maneira, quando se diz que o mascate virou “doutor” é um modo de confirmar o sucesso de uma imigração”, destaca a pesquisadora.
Dom Pedro II
Para averiguar se Dom Pedro II havia mesmo incentivado a vinda de libaneses para o Brasil, a pesquisadora foi pesquisar os diários do imperador no Arquivo do Museu Imperial, em Petrópolis. “Não encontrei nenhum material que confirmasse isso ”, diz. De acordo com Samira, o incentivo de D. Pedro II a imigração libanesa pode ser encontrada em alguns livros não acadêmicos escritos por imigrantes. “Alguns grupos repetiram tanto esta ideia como se ela fosse uma verdade. Por isso, muitos acreditam. Quando o ex-presidente Lula foi ao Oriente Médio, esse mito foi recuperado”, lembra.
Para averiguar se Dom Pedro II havia mesmo incentivado a vinda de libaneses para o Brasil, a pesquisadora foi pesquisar os diários do imperador no Arquivo do Museu Imperial, em Petrópolis. “Não encontrei nenhum material que confirmasse isso ”, diz. De acordo com Samira, o incentivo de D. Pedro II a imigração libanesa pode ser encontrada em alguns livros não acadêmicos escritos por imigrantes. “Alguns grupos repetiram tanto esta ideia como se ela fosse uma verdade. Por isso, muitos acreditam. Quando o ex-presidente Lula foi ao Oriente Médio, esse mito foi recuperado”, lembra.
As entrevistas foram feitas com 3 grupos familiares muçulmanos, totalizando 10 pessoas, e 2 grupos familiares cristãos, totalizando 7 pessoas.
Para os primeiros imigrantes que chegaram ao Brasil, uma das dificuldades iniciais foi entender a Língua Portuguesa. Mas uma forma interessante de aprendizado se deu por meio do contato com outros imigrantes, vizinhos de origem italiana e portuguesa por meio das atividades do cotidiano.
Samira destaca também o papel das mulheres, tanto nos libaneses cristãos como nos muçulmanos. A restrição ao trabalho delas era geral, mas muitas ajudavam seus maridos nas atividades de mascate. “Mas o grande destaque delas foi na filantropia. O Hospital Sírio-Libanês originou-se a partir da iniciativa de mulheres da comunidade libanesa”, finaliza a pesquisadora.
Imagem com montagem das bandeiras: Igor Máia/USP Imagens
Imagem da capa do livro: cedida pela pesquisadora
Mais informações: email sa.osman@uol.com.br, com a pesquisadora Samira Osman
Nenhum comentário:
Postar um comentário