quarta-feira, 29 de junho de 2011

Leonardo Boff, fim do capitalismo e sujeitos indefinidos

É muito interessante e proveitoso ler um intelectual reconhecido, brilhante teólogo e de profundas convicções religiosas, que utiliza elementos do marxismo como referência para discutir o capitalismo, na fase terminal desse sistema. Principalmente, quando alguns marxistas apressados, em nome de uma modernidade indefinida, desfazem-se de alguns conceitos e algumas idéias, tornando essa metodologia apenas uma peça de museu. Leonardo Boff, ex-capuchinho franciscano, vem mostrar-nos, com naturalidade, porque não se pode refugar essa ferramenta.

Peço-lhes licença, no entanto, para fazer alguns comentários a respeito do artigo, Crise terminal do capitalismo, publicado pelo boletim eletrônico da Fundação Lauro Campos (http://socialismo.org.br/) – Socialismo e Liberdade, que reproduzo abaixo.

Nesse trabalho, Leonardo Boff opta por contornar o antagonismo das classes sociais do capitalismo*, pois sequer as cita, apesar de mencionar um subproduto delas, o “exército de reserva” **. Prefere se referir aos “indignados”, que enchem as ruas e praças em vários países e aos “ladrões” que “estão refestelados em Wall Street, no FMI e no Banco Central Europeu”.

Não deixa de apontar, porém, que a destruição do meio ambiente e o estrangulamento das condições de vida de enormes contingentes de exploradas e explorados (“, castigando a Mãe Terra e penalizando a vida de seus filhos e filhas. – último §), farão secar as fontes em que o próprio capitalismo se alimenta: o lucro e, em conseqüência, a mais-valia.

Segundo Marx, as “forças produtivas”, agentes de toda criação de riquezas, cuja liberação do jugo das classes dominantes é indispensável para o surgimento de uma sociedade verdadeiramente humana, possuem três componentes inseparáveis: o ser humano, responsável pelo dinamismo, a natureza e a tecnologia.

Nesse entendimento, embora como um bem de produção pareça ser fonte de riqueza, a máquina não pode substituir o trabalho humano, o único componente remunerado pelo salário, a não ser como uma ilusão, que conduzirá o capitalismo ao seu próprio fim. É, justamente, da parcela da produção, pela qual as trabalhadoras e os trabalhadores – a força de trabalho - não recebem remuneração, que se alimenta o capitalismo.

A própria burguesia, classe dona dos meios de produção, vai, gradativamente, minguando, sendo que a parcela falida de seus integrantes passam a engrossar a multidão explorada. Isso derruba as teorias, que atribuem capacidade de longo período de realização da mais-valia com base no consumo de auto-padrão.

Além disso, ao marginalizar um número gigantesco e crescente de pessoas do mercado de consumo, coisa que nenhum paliativo (como o “Salário Família”) pode disfarçar por muito tempo, o sistema capitalista irá deixando de realizar a mais valia, também, por falta de consumidores.

Desculpem os leitores, se me alonguei nessas considerações. Pois, o texto de Leonardo Boff, a seguir, ainda que não defina os sujeitos da história que conta, merece o melhor das atenções.

Um grande abraço do,
William.
27/06/2011.

*O antagonismo de classes, para Marx, dar-se-ia entre as classes, cujos interesses econômicos polarizam na sociedade capitalista: a burguesia, classe dominante, dona dos meios de produção; e o proletariado e seus agregados, a classe trabalhadora, composta pelos assalariados pela burguesia. Cada qual com os seus agregados. Há, também, as classes intermediárias, formadas pela classe média e a pequena burguesia.

** “Exército de reserva” ou “exército industrial de reserva”, no conceito marxista, é a parcela de trabalhadoras e de trabalhadores mantida desempregada pelo mercado de empregos do capitalismo, justamente, para, através da competição, pressionar para baixo o nível salarial das e dos, que estão empregados.
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Fundação Lauro Campos
SOCIALISMO e LIBERDADE
fundacao@socialismo.org.br
http://socialismo.org.br/

Crise terminal do capitalismo?
Ecologia
Leonardo Boff
Sex, 24 de Junho de 2011 12:02


Leonardo Boff

Tenho sustentado que a crise atual do capitalismo é mais que conjuntural e estrutural. É terminal. Chegou ao fim o gênio do capitalismo de sempre adaptar-se a qualquer circunstância. Estou consciente de que são poucos que representam esta tese. No entanto, duas razões me levam a esta interpretação.

A primeira é a seguinte: a crise é terminal porque todos nós, mas particularmente, o capitalismo, encostamos nos limites da Terra. Ocupamos, depredando, todo o planeta, desfazendo seu sutil equilíbrio e exaurindo excessivamente seus bens e serviços a ponto de ele não conseguir, sozinho, repor o que lhes foi sequestrado. Já nos meados do século XIX, Karl Marx escreveu profeticamente que a tendência do capital ia na direção de destruir as duas fontes de sua riqueza e reprodução: a natureza e o trabalho. É o que está ocorrendo.

A natureza, efetivamente, se encontra sob grave estresse, como nunca esteve antes, pelo menos no último século, abstraindo das 15 grandes dizimações que conheceu em sua história de mais de quatro bilhões de anos. Os eventos extremos verificáveis em todas as regiões e as mudanças climáticas tendendo a um crescente aquecimento global falam em favor da tese de Marx. Como o capitalismo vai se reproduzir sem a natureza? Deu com a cara num limite intransponível.

O trabalho está sendo por ele precarizado ou prescindido. Há grande desenvolvimento sem trabalho. O aparelho produtivo informatizado e robotizado produz mais e melhor, com quase nenhum trabalho. A consequência direta é o desemprego estrutural.

Milhões nunca mais vão ingressar no mundo do trabalho, sequer no exército de reserva. O trabalho, da dependência do capital, passou à prescindência. Na Espanha o desemprego atinge 20% no geral e 40% e entre os jovens. Em Portugal, 12% no pais, e 30% entre os jovens. Isso significa grave crise social, assolando neste momento a Grécia. Sacrifica-se toda uma sociedade em nome de uma economia, feita não para atender as demandas humanas mas para pagar a dívida com bancos e com o sistema financeiro. Marx tem razão: o trabalho explorado já não é mais fonte de riqueza. É a máquina.

A segunda razão está ligada à crise humanitária que o capitalismo está gerando. Antes se restringia aos países periféricos. Hoje é global e atingiu os países centrais. Não se pode resolver a questão econômica desmontando a sociedade. As vítimas, entrelaças por novas avenidas de comunicação, resistem, se rebelam e ameaçam a ordem vigente. Mais e mais pessoas, especialmente jovens, não estão aceitando a lógica perversa da economia política capitalista: a ditadura das finanças que via mercado submete os Estados aos seus interesses e o rentitentismo dos capitais especulativos que circulam de bolsas em bolsas, auferindo ganhos sem produzir absolutamente nada a não ser mais dinheiro para seus rentistas.

Mas foi o próprio sistema do capital que criou o veneno que o pode matar: ao exigir dos trabalhadores uma formação técnica cada vez mais aprimorada para estar à altura do crescimento acelerado e de maior competitividade, involuntariamente criou pessoas que pensam. Estas, lentamente, vão descobrindo a perversidade do sistema que esfola as pessoas em nome da acumulação meramente material, que se mostra sem coração ao exigir mais e mais eficiência a ponto de levar os trabalhadores ao estresse profundo, ao desespero e, não raro, ao suicídio, como ocorre em vários países e também no Brasil.

As ruas de vários países europeus e árabes, os "indignados" que enchem as praças de Espanha e da Grécia são manifestação de revolta contra o sistema político vigente a reboque do mercado e da lógica do capital. Os jovens espanhois gritam: "não é crise, é ladroagem". Os ladrões estão refestelados em Wall Street, no FMI e no Banco Central Europeu, quer dizer, são os sumo-sacerdotes do capital globalizado e explorador.

Ao agravar-se a crise, crescerão as multidões, pelo mundo afora, que não aguentam mais as consequências da super-exploracão de suas vidas e da vida da Terra e se rebelam contra este sistema econômico que faz o que bem entende e que agora agoniza, não por envelhecimento, mas por força do veneno e das contradições que criou, castigando a Mãe Terra e penalizando a vida de seus filhos e filhas.

Leonardo Boff é teólogo e escritor, autor do livro "Proteger a Terra – cuidar da vida: como evitar o fim do mundo" (Record 2010).
socialismo.org.br

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