sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Aumento do IDH sem mais saneamento é mera retórica

"Enquanto o Brasil mantiver os atuais índices de saneamento e continuar matando crianças todo dia por falta de água tratada e coleta e tratamento de esgotos, ninguém pode se orgulhar de resultados sociais e de aumento do IDH, já que também não avançamos, segundo o relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), nos quesitos educação e saúde."
A declaração é do presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), José Aurélio Boranga, ao analisar o anúncio feito ontem no Palácio do Planalto, indicando um aumento no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, em relação ao ano passado, que permitiu que o país entrasse pela primeira vez no grupo dos países de Alto Desenvolvimento Humano. De acordo com o relatório do PNUD, em termos absolutos, o país ultrapassou a barreira de 0,800 (linha de corte) no índice — que varia de 0 a 1 —, considerada o marco de alto desenvolvimento humano. Em termos relativos, o Brasil caiu uma posição no ranking de 177 países e territórios: de 69º, em 2006, para 70º este ano.

Dados que envergonham
O presidente da ABES classificou como "vergonhosos" os dados sobre saneamento no Brasil, lembrando os dados divulgados no mesmo dia pelo Instituto Trata Brasil, do qual a ABES faz parte, dando conta de que mais de 50% da população não têm esgotos coletados e dos cerca de 47% que contam com esses serviços, apenas cerca de 31% são tratados (dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental - SNSA), o que agrava a situação do saneamento e compromete o abastecimento de água.
"O Brasil ainda tem 7,5 milhões de pessoas que sequer tem banheiro com vaso sanitário em casa. Além disso, o Brasil gera, diariamente, mais de 162 mil toneladas de lixo urbano. Desse total, apenas 40% recebem tratamento adequado, em aterros sanitários. Mas, o destino final de 60% da coleta dos resíduos sólidos (domiciliares e comerciais) produzidos em todo o país ainda é o lixão. Pelo menos 10% (quase 19 milhões de pessoas) não são atendidas com serviços de coleta e disposição final de resíduos sólidos – o famoso lixo doméstico e urbano", lembrou Boranga.
O presidente da ABES cobrou do governo brasileiro o compromisso assumido de cumprir as Metas do Milênio traçadas pela ONU, que prevêem a redução à metade o número de pessoas sem acesso a serviços água e de esgoto, até 2015. Mas lembrou que isso significa que, em oito anos, para atender as Metas, o Brasil precisaria investir R$ 100 bilhões para conseguir dar saneamento à metade da população, ou seja, nove milhões de pessoas com água tratada e mais de 40 milhões de pessoas com esgotamento sanitário, tomando por base a própria estimativa de necessidade de recursos definida pelo governo Lula, de R$ 178 bilhões em 20 anos, a partir de 2004.
Mas com os atuais níveis de investimentos, segundo estudo recente da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe), o Brasil só conseguirá a universalização dos serviços de abastecimento de água em 2034 e de esgoto, segundo os dados mais pessimistas divulgados pelo Instituto Trata Brasil, no próximo século.
José Aurélio Boranga disse ainda que o anúncio do PAC, que acena com R$ 40 bilhões nos próximos quatro anos para o saneamento, poderia atenuar esse problema, desde que as liberações de recursos sejam transformadas em desembolsos efetivos. Mas de acordo com dados da própria Caixa Econômica Federal (CEF), principal agente financeiro do saneeamento, entre 2002 e 2007, foram feitos 754 contratos, que representam R$ 5,5 bilhões, dos quais apenas R$ 1,9 bilhão foi efetivamente desembolsado. Pelos dados do Ministério das Cidades, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) teria comprometido mais R$ 2,55 bilhões, o próprio Ministério mais R$ 1,92 bilhão, o BNDES outros R$ 1,07 bilhão e o Ministério da Integração Nacional R$ 720 milhões.

Morte anunciada
A falta de coleta e tratamento de esgoto – e a conseqüente contaminação da água por coliformes fecais – é a principal causa da mortalidade de crianças de zero a cinco anos de idade por diarréia e doenças parasitárias, enfermidades que proliferam em áreas sem saneamento básico. Sete crianças morrem todo dia no País, em decorrência de diarréia. Por ano, são mais de 2.500 crianças menores de cinco anos vítimas da doença que prolifera em áreas sem saneamento básico, segundo a pesquisa do Instituto Trata Brasil.

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