sexta-feira, 13 de julho de 2007

Onde há fumaça, há fogo

O William Jorge Gerab, nosso competente sociólogo paulistano, envia esta reflexão importante para a sociedade, principalmente para aqueles que ainda não foram picados pela mosca azul do neoliberalismo.
leiam e reflitam,
Gilberto.

Comp@s,

As propostas e projetos, que contribuem para o aprofundamento do neoliberalismo no Brasil, o que inclui a irresponsável retirada de recursos do setor público, colocam os interesses do funcionalismo e de toda a população em situação de crescente fragilidade. Além de não podermos nos descuidar da reestruturação do nosso quadro de carreiras, cargos e salários, temos que aguçar a nossa percepção de novos ataques, alguns de caráter bastante amplo.

Abaixo estão dois textos, que discutem o direito de greve para funcionalismo público. O primeiro, publicado no jornal Correio da Cidadania, é de um Procurador de Justiça. Já, o segundo, de minha autoria, estou lhes reenviando devido à volta da temática às discussões. Essa mensagem é uma contribuição para o nosso aquecimento preparatório aos novos momentos de luta, que teremos que enfrentar. Afinal, como diz o ditado: “onde há fumaça, há fogo”.

Se os nossos algozes estão querendo nos desarmar, nos deixar sem defesas, é porque pretendem nos atacar de forma definitiva, terminal. Não há qualquer exagero no vaticínio de que querem acabar com um serviço público, capaz de resistir às arbitrariedades que são impingidas à população (más administração e qualidade de serviços e obras, desvios indesejáveis de recursos, corrupção) e capaz de garantir o atendimento à população através das gestões dos mandatários em revezamento.

Não é sem razão que, muito além de alheios aos apelos contra a terceirização dos serviços públicos, que contribuem enormemente à sua deterioração, nossos governantes querem, agora, acabar de vez com o regime estatutário (visando, entre outras coisas, acabar com a estabilidade) e implantar a contratação pela CLT para todo o funcionalismo. Com o mesmo intuito, aprofundam o desgaste da Previdência dessa categoria profissional.

Por tudo isso, companheiras e companheiros do funcionalismo, além de todas e todos, que conhecem a sua importância dos serviços públicos para a maioria da população num país em “desenvolvimento”, como o Brasil, temos que “ABRIR OS OLHOS”.

Um abraço,
William
13/07/2007.

Correio da Cidadania

Direito de greve no serviço público
Escrito por Airton Florentino de Barros* - 12-Jul-2007

Tem o trabalho importante participação na produção de riquezas. Quando, apesar de todas as tentativas de negociação, o empregador, na busca do maior lucro, desconsidera o empregado, surge em favor deste como alternativa última a paralisação do trabalho, para que o empregador, sofrendo prejuízo, reconheça afinal a relevância do trabalhador. E, numa sociedade republicana, democrática, igualitária, justa e solidária, que deve assegurar a proteção do mais fraco contra o mais forte, deve o Estado assegurar esse direito.

De fato, o direito de greve, tão extremo quanto legítimo, é o mais importante instrumento dos direitos sociais, sobretudo em razão de sua eficácia na imposição de maior equilíbrio entre empregado e empregador.

Há quem diga que a greve vem sendo utilizada com objetivo meramente político, quando seu único objetivo seria a reivindicação salarial.

Entretanto, ao assegurar ao trabalhador esse direito, decretou a Constituição Federal competir aos trabalhadores decidir tanto sobre a oportunidade de exercê-lo como sobre os interesses que devam por meio dele defender (CF, art. 9º). Em outros termos, o objetivo da greve pode referir-se a tudo que puder comprometer os direitos trabalhistas. Aliás, só o indivíduo completamente ignorante é que não sabe que o custo de vida ou, por conseqüência, o poder aquisitivo do salário é determinado pela política.

Há quem diga também que, em razão da ausência de regulamentação própria, os funcionários públicos não teriam esse direito, apesar da clareza do texto constitucional, no sentido de que seu direito de greve será exercício nos termos da lei (CF, art. 37, VII). Ora, até por isonomia, a lei geral de greve aplica-se a todos os trabalhadores sem exceção. Não é sem motivo que a mencionada lei, para evitar dúvida a respeito, regulamentou o direito de greve também no setor público, incluindo no rol de serviços essenciais os relativos à assistência médica e hospitalar, fazendo especial referência à saúde pública (Lei nº7.783/89, art.10, II e 11).

Assim, o fato de serem os serviços prestados pelo Estado essenciais para a coletividade não impede que exerçam seus servidores o direito de greve.

Mais ainda: na relação entre empregador e empregado da iniciativa privada, ocupa o Estado a função de fiscalizador, a fim de evitar o abuso do mais forte sobre o mais fraco e assegurar a observância dos direitos trabalhistas. Ainda mais importante e necessário, então, garantir-se o direito de greve ao funcionário público que, ao contrário dos demais trabalhadores, não pode contar com a tutela do Estado, aí seu empregador e autor de abusos que o empregador comum não costuma praticar.

Ademais, implantou-se no país a escola econômica neoliberal pró-globalização, defensora da teoria do chamado Estado-mínimo, que financia o sucateamento da administração pública para convencer o povo da necessidade da privatização de serviços essenciais. Se a destruição do Estado é o objetivo, natural seja o seu quadro de recursos humanos também vítima desse desmonte, seja por meio da multiplicação das contratações de servidores sem concurso, da terceirização, da fraude do cooperativismo para o emprego de mão de obra e da redução dos direitos trabalhistas e previdenciários dos funcionários públicos.

Nesse contexto, considerando que nas duas últimas décadas esse segmento nada tem conseguido senão a perda de direitos, fácil verificar que os pleitos trabalhistas dos servidores públicos nunca foram excessivos, restringindo-se apenas ao necessário para a manutenção de sua dignidade.

Cabe ao Estado estruturar-se para, em tais casos, evitar ou reduzir ao máximo os danos decorrentes da paralisação de serviços públicos (Lei nº7.783/89, art.12).


*Airton Florentino de Barros é procurador de justiça em SP, fundador do MPDemocrático e professor de Direito Comercial.


A POLÊMICA DA GREVE NOS SETORES ESSENCIAIS:
O EXPOSTO, O CAMUFLADO E O PUBLICOFOBISMO
[1].
William Jorge Gerab[i] – 08/03/07

Já se disse: “a estranha realidade das coisas é a minha constatação de todos os dias”. Nesses tempos de tsunames, superaquecimentos, escassez de água, balas perdidas e assassinatos de crianças, essa frase é, no mínimo, uma questão de cautela. Só que, no caso, a cautela, ao invés de conter, deve nos impulsionar na luta pela sobrevivência, tanto da humanidade, quanto do planeta, pois uma não tem sentido sem o outro.

É por isso, também, que não se pode banalizar, achar normal e comum, que um tema recorrente, como o da regulamentação da greve nos chamados “setores essenciais”, nos passe despercebido. É indispensável que tentemos entender melhor o significado desse título de ”setores essenciais”, o porquê da preocupação em impedir ou mesmo de criar maiores limites para a greve nesses setores e, também, que se destaque um figurante, até agora quase invisível, no cenário desse debate: o publicofobismo.

O que é “setor essencial” nos serviços públicos?

Não vamos fazer, aqui, uma discussão jurídica. Tampouco usaremos este espaço para fazermos a apologia do serviço público. O próprio governo e a grande mídia colocaram o assunto como uma questão política e de administração pública. Posto desta forma, de imediato nos confrontamos com um impasse: existe algum serviço público, que não seja essencial? Se existe, não seria descartável e sua manutenção serviria, apenas, para gastos desnecessários de recursos públicos?

Alguém, seriamente empenhado em melhorar as condições de vida da população, poderia argumentar que serviço público essencial é aquele que não pode faltar, sequer por um minuto. Essa argumentação não resolveria por completo as nossas dúvidas, pois não poderíamos viver qualquer instante sem termos os serviços de educação, de cultura, de justiça, das penitenciárias e “abrigos” de menores, além de muitos outros, que erroneamente poderiam ser jogados nessa obscura vala dos “não essenciais”.

Mas, se para manter o diálogo dessa aparente democracia, aceitarmos o conceito de “essencial” como “o que é mais imediatamente necessário para manter a vida humana, o funcionamento cotidiano da sociedade e sua economia”, teríamos que mencionar, pelo menos: os serviços da área da saúde, os transportes e o sistema viário (a parte física e a funcional), a segurança pública, o fornecimento dos vários tipos de energia e os serviços de saneamento básico (lixo, esgoto e fornecimento de água).

Deveríamos incluir outros, como os serviços e obras de combate às enchentes e a defesa civil como um todo, os serviços encarregados do fornecimento de habitações para população de baixa renda (afinal, tirá-las das áreas de riscos e mananciais são tarefas vitais, também). Mas, para não voltarmos à situação anterior, vamos parar nas que, supostamente, já estão incluídas no acordo como “essenciais”.

Como “setores essenciais” esses serviços públicos precisam de atenção especial, receberem recursos materiais e humanos com privilégios, em relação aos demais setores. Portanto, nesses setores não podem existir demandas desatendidas ou reprimidas:
• os prédios da área da saúde devem ser adequados para manter a higiene e acomodar todos os que necessitarem desses serviços;
• tem que haver ônibus e metrôs em quantidade suficiente e onde necessários;
• as ruas e estradas teriam que estar bem pavimentadas e serem suficientes para escoar o tráfego;
• a segurança pública teria que dispor de pessoal bem equipado e bem orientado para garantir o ir, o vir e a necessária tranqüilidade às pessoas,
• a energia (das várias fontes) teria que ser suficiente, no mínimo, até o fim do decênio;
• finalmente, o saneamento básico teria que estar funcionando como medicina preventiva, garantindo a boa saúde da população e, inclusive, economizando nos altíssimos recursos demandados pela área da saúde - não só o suficiente para não entupir as ruas de lixo, não contaminar nossas casas, termos “água de beber” e orientação para usá-la bem.

Nessas condições, onde entraria a tal regulamentação do direito de greve nos setores essenciais? Na realidade, sequer a discussão de greve teria espaço, pois as razões que levam os trabalhadores a entrarem em greve são:
− os baixos salários, o que não aconteceria, pois os recursos humanos teriam atenção especial (o que inclui salários adequados) nos “setores essenciais”;
− a falta de condições de trabalho, que, também, estaria afastada, pois prédios, equipamentos e materiais adequados seriam garantidos nesses setores
− e o respeito aos direitos trabalhistas, inclusive o treinamento para o bom atendimento ao público e a atualização profissional, comporiam o quadro da manutenção adequada e da boa qualidade desses serviços.

Resumindo, o que define esses setores como essenciais é a atenção dada pelo governo a eles e não a proibição ou estreitamento do direito de greve dos seus trabalhadores. O que está escondido nesse debate, agora trazido à tona pelo governo e pela grande mídia (ambos comprometidos com os interesses dos grandes capitais) é a utilização dos trabalhadores como “bodes expiatórios” das péssimas condições em que se encontram esses setores. Tentam jogar a culpa sobre os funcionários dos “setores essências” e enganar a opinião pública sobre quem são os seus verdadeiros vendilhões.

Por que querem jogar a culpa nos trabalhadores pelas greves e pelos péssimos serviços prestados nos chamados “setores essenciais”?

Para garantir os altos lucros aos banqueiros e grandes capitalistas em geral, favorecendo-os nas decisões econômicas e nas aplicações de recurso públicos, o governo Lula (que se elegeu para favorecer a maioria da população, mas foge de comprar briga com os poderosos) vai continuar mantendo a míngua aos que chama de “serviços essenciais”. Só que esse governo não pretende assumir a responsabilidade por esse seu ato, assim como os grandes capitalistas, ambos apoiados pela grande mídia.

Portanto, nessa falsa polêmica da regulamentação das greves nos “setores essenciais”, o pior é o fato de que continuarão piorando os serviços dos quais a população depende crescentemente, sem ter alternativas. Isso é mais grave ainda se lembrarmos que ocorre num país, cujo governo favorece às minúsculas elites econômicas internas e externas, jogando a maioria dos seus habitantes ao arrocho salarial, ao desemprego e à desassistência. É isso que o “descatracamento” do “espetáculo do crescimento”, do qual fala Lula, nos promete através do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento), conforme qualquer analista –sem “rabo preso” com o governo – pode nos confirmar.

Quem quer fazer coisas muito ruins para a população, mas não quer que ela o culpe por isso, precisa arrumar alguém para levar a culpa. Assim, lhes parece fácil escolher os funcionários públicos, que já vêm sendo há muito tempo alvo da “fritura” dos poderosos e sua grande mídia, responsáveis, inclusive, pela atribuição e difusão da injusta pecha de “ociosos”. Isso explica o porquê do funcionalismo público é, propositadamente, confundido com os beneficiários dos cabides de emprego (dos cargos de confiança desnecessários) e dos altos salários e aposentadorias (recebidos por um pequeno número).

Portanto, a autoria histórica desse desgaste da imagem do funcionalismo, frente à população, é das mesmas elites econômicas, que agem contra a própria população, auxiliadas pelos seus representantes nos governos e sempre com o apoio dos grandes jornais, grandes revistas e grandes emissoras de rádio e televisão. Transformaram seus “cabos eleitorais” em falsos funcionários públicos (não concursados e sem funções úteis à população), fizeram tráfico de influência e corrupção e, eles mesmos, vêm a público para pichar o funcionalismo e usá-lo como “bode expiatório”.

Abusando desse comportamento contraditório, agora tentam colocar a população trabalhadora e pobre contra os trabalhadores dos serviços públicos (que, na grande maioria, também são pobres, pois recebem baixos salários), de cujos serviços tornaram-na dependente. Isto é, como aconteceu durante toda a história do Brasil, governo e elites se unem para tentar fazer a população agir contra seus próprios interesses.

Combater a publicofobia!

Não é exagero utilizar esse neologismo, “publicofóbico", para designar quem tem aversão ao funcionalismo público. Afinal, numa sociedade de classes, com péssima distribuição de renda, não é possível ter aversão ao serviço público e ao funcionalismo público sem, no mínimo, estar esquecendo das necessidades do próprio público.

Foi por essa propagada falta de entendimento e respeito pelo o que é do público e pelo público em si que, talento dos autores a parte, fizeram sucesso no passado músicas como “Maria Candelária” (de Klécio Caldas e Armando Albuquerque em 1952). Piores ainda, tendo a mesma origem de desprezo ao público, são afirmações mais recentes, como a de um ditador militar, em entrevista de veiculação nacional: “prefiro o cheiro de cavalo ao cheiro de povo”.

O ataque ao funcionalismo e aos serviços públicos ganharam ainda mais força e espaço na grande mídia com a chegada do neoliberalismo, que tem como uma das principais características a minimização da influência do estado na economia, o que, necessariamente, inclui a minimização dos investimentos dos recursos públicos nos serviços à população e a minimização do próprio estado. Só que a diminuição do estado, proposta pelo neoliberalismo, ao contrário de diminuir um peso sobre o conjunto da sociedade, favorece apenas o grande capital, que não quer pagar impostos e nem direitos trabalhistas, mas deixa a grande maioria da população ainda mais desassistida.

O grande capital, principalmente o financeiro (em grande parte escondido nas chamadas grandes potencias), precisa das políticas e práticas neoliberais, já que pretende destruir todas as barreiras contra a exploração dos demais países (chamados de emergentes, em desenvolvimento, dependentes, neocoloniais, semicoloniais ou coloniais). Não foi a toa que Collor se elegeu (1989), tendo como uma das alavancas do seu marketing eleitoral o “combate aos marajás” – aproveitando para fazer o povo confundir todo funcionalismo público com alguns funcionários, que eram corruptos e desfrutavam de altos salários.

Tanta pressão publicofóbica propiciou o surgimento de publicofobias de vários tipos, das quais destacamos as duas limitantes: a daqueles que “nem sabem bem por que, mas a culpa é do funcionalismo” (na qual se pode enquadrar diversos representantes das grandes mídias); a daqueles que sabem muito bem porquê utilizam a publicofobia, pois para fazerem vingar os seus propósitos de grandes capitalistas, de permanecerem no poder e/ou se locupletarem, precisam dividir a população oprimida e trabalhadora (no caso entre trabalhadores do setor público e do setor privado) e, com isso, facilitar o seu controle.

Felizmente, a publicofobia não conseguiu atingir a maior parte da população. Além disso, uma ampla parcela dos que foram enganados poderão se livrar dessa armadilha. Para isso, é urgente que se desmascare o governo, que tenta se passar como popular, e deixe claras as suas intenções de favorecer os poderosos, abandonando a população a ver navios, no que tange aos investimentos públicos de importância para ela.

Além disso, é fundamental, que os trabalhadores dos serviços públicos e todos os trabalhadores dos outros setores, que combatem o neoliberalismo e as medidas pró-neoliberais do governo Lula, combinem as suas campanhas com campanhas por políticas públicas, que ajudem as diversas parcelas da população a exigir do governo os investimentos de que necessitam, contemplando as características locais e específicas dessas parcelas populares. Não se pode esquecer, também, que as demandas ambientais devem ser integrantes obrigatórias de todas as campanhas do movimento social, pois não há atividade humana que prescinda das boas condições do planeta, seja sob aspectos localizados, seja sob o aspecto global.

É assim que conseguiremos contribuir para derrotar a política de dividir os trabalhadores e contribuir para o avanço da maioria da população na luta pelos seus direitos e interesses imediatos (melhores condições de vida e de trabalho) e históricos (uma sociedade com melhor distribuição de renda e sem injustiças sociais).

[1] Publicado na revista virtual “Partes”, em 10/03/07 – www.partes.com.br .
[i] Sociólogo, com especialização em Gestão Ambiental e funcionário público municipal aposentado.

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