segunda-feira, 16 de julho de 2012

Pelo fim da censura às biografias



(*)Newton Lima
      Nas últimas semanas participei de dois eventos que reuniram grandes nomes da literatura e do mercado editorial brasileiros: a Festa Literária Internacional de Paraty e o encontro de escritores da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Nas duas ocasiões, tive a oportunidade de defender o Projeto de Lei (PL 393/2011) que propus logo que assumi uma cadeira na Câmara Federal, sugerindo a ampliação da liberdade de expressão, informação e acesso à cultura na divulgação de dados biográficos de pessoas cujos atos sejam de interesse da coletividade.

      O referido projeto – em tramitação na Câmara – altera o artigo 20 do Código Civil, que estabelece que “(...) a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas (...) se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade (...)”. Em meu projeto tento acabar com esse resquício de censura determinando que a mera ausência de autorização não impede a divulgação de imagens, escritos e informações com finalidade biográfica da pessoa cuja trajetória pessoal ou profissional esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade.

     Muitos poderão questionar se isso não configuraria um caso de conflito entre os dois direitos constitucionais: o da liberdade de expressão e o da privacidade e à imagem. Entendo que não, por um motivo muito simples: as personalidades são pessoas cujas trajetórias profissionais e pessoais confundem-se e servem de paradigma para toda a sociedade. Por sua posição de destaque, elas influenciam condutas e decisões de diversos seguimentos sociais, que valorizam as escolhas pessoais realizadas por tais “celebridades”, muitas vezes até reproduzindo-as.

      Nossa legislação, entretanto, não faz qualquer distinção entre pessoas públicas e demais cidadãos desconhecidos. Em outros países, como Inglaterra e Estados Unidos, o fato das personalidades frequentarem constantemente a mídia diminui o seu direito de imagem e privacidade, tornando lícitos, por exemplo, a publicação de biografias sem a necessidade de prévio consentimento. Nesses países, os interesses da coletividade em ter acesso às informações são garantidos pela não-exigência de autorização para a publicação de biografias.

      Vale enfatizar que essa não-exigência de autorização não significa atentado à dignidade da pessoa humana, garantido pelo artigo 1º, III, da Constituição Federal. Bem como permanece garantido o direito ao nome, previsto pelo artigo 17 do Código Civil. Eventuais conflitos destes direitos devem ser dirimidos no âmbito da Justiça, onde os tribunais proferem suas decisões à luz dos fatos concretos.

      Em um mundo cada vez mais globalizado, em que o acesso irrestrito à informação torna-se inevitável, a censura às biografias representa um antiquado cerceamento do direito de expressão tão caro aos brasileiros. Que o digam os fãs de Mané Garrincha, Roberto Carlos, Di Cavalcanti, entre outros, que viram as obras sobre seus ídolos serem brutalmente censuradas.

       A liberdade às vezes incomoda, mas as restrições a ela, como nos ensinou a experiência da ditadura, acabam nos levando às trevas.

      (*) Deputado Federal (PT-SP), presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara, ex-prefeito de São Carlos e ex-reitor da UFSCar

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